No ano 1982 conclui o 9º Ano do Curso Unificado e decidi deixar os estudos devido a dois factores.
Em primeiro lugar, o facto de todas as minhas companheiras de vida académica terem ficado pelo caminho e, do grupo, quase ninguém ter completado o 9º Ano provocou em mim uma grande desmotivação. Em segundo lugar, as condições de vida familiar não eram as melhores para, naquele tempo, poder estudar. O meu pai era funcionário (revisor) da CP e não vinha a casa com regularidade. A minha mãe explorava um estabelecimento comercial (café e mercearia de aldeia) onde ocupava quase todo o seu tempo, pois todos sabemos que este tipo de actividade, numa aldeia, não tem horário de abertura, de encerramento e nem de almoço.
Quando regressava da escola, ajudava a minha mãe nas tarefas domésticas, pois, naquela altura, ainda não havia as «Marias» que, felizmente, vieram poupar muito esforço e tempo às mulheres – máquinas de lavar roupa e louça. Embora a minha mãe não me obrigasse a cumprir estas tarefas e até me aconselhasse a dedicar-me mais aos meus estudos, eu não deixava de a ajudar pois a sobrecarga do seu trabalho não me deixava concentrar devidamente nas minhas obrigações escolares. Como agravante a minha casa era por cima do café, onde havia constantemente barulho e até altas horas da noite.
Passaram-se quase 25 anos e, durante esse tempo, sinceramente, nunca pus a hipótese de regressar à Escola. Isso era uma questão que nunca existia ou se, por um momento, existia, eu punha de lado não deixando que criasse raízes.
Os anos foram passando e pouco a pouco a minha capacidade de discernimento foi crescendo.
Num dado momento da minha vida, daqueles momentos de reflexão que, por muito que não queiramos, todos fazemos, dei conta que cometi alguns erros e que ainda era tempo de corrigir alguns deles. Procurei algumas pessoas mais ou menos da minha idade que frequentavam o Ensino Nocturno e troquei com elas algumas ideias. Foi esta atitude que fez renascer em mim a vontade de aprender e valorizar-me. Tinha de tomar a decisão…foi difícil… «conciliar o papel de mulher, dona de casa, mãe e trabalhadora…e ainda …estudar à noite! Que tarefa árdua! Serei capaz?»
Não fiquei parada. Decidi então voltar à Escola. Fui pedir informações à Escola Secundária Martinho Árias onde me esclareceram que para fazer o 10º, 11º e 12º anos tinha duas opções: uma seria participando em aulas, outra seria em regime não presencial. Após o esclarecimento de algumas dúvidas fiz a minha matrícula, optando pelo regime não presencial. A outra opção era muito exigente para uma aluna com tantas obrigações fora da Escola pois o horário escolar era das 19H às 23H 50 m.
Quando iniciou o ano lectivo 2005/2006, eu fui ao primeiro dia (noite) de aulas. Achei tudo muito estranho e ao mesmo tempo tudo muito especial. Eu?!! Ali sentada?!! De novo… na cadeira da escola?!! Com o quadro, os professores, as colegas…Os meus olhos devem ter estado mais azuis do que o costume, com a adrenalina que me corria nas veias!
Os professores explicaram que o regime não presencial era mais difícil, pois iríamos ter exames no fim de cada módulo e sem assistir às aulas seria tarefa custosa.
Decidi então pelo regime presencial, uma vez que me sentia como uma criança, «com sangue na guelra». Aquele ambiente estava a rejuvenescer-me.
Como geralmente acontece em qualquer situação nova, tive algumas dificuldades de adaptação aos novos horários da minha vida, à coordenação de todas as minhas tarefas e ao espaço escolar que partilhava com colegas e professores. Durante as aulas sentia dificuldades na forma de me expressar oralmente e na escrita.
O tempo foi passando e eu passei a sentir-me muito mais à vontade.
Consegui fazer o 10º Ano com resultados excelentes.
Estou a fazer o 11º Ano e desejo voltar no próximo ano lectivo para atingir o meu objectivo – 12ºAno.
Tenho a certeza que vou conseguir, devido a dois factores essenciais: força de vontade interior e ajuda especial do cônjuge.
Sinto imensa força interior para levar a bom porto o que me propus fazer e como não costumo desistir! … A colaboração do cônjuge também é deveras importante, pois sem a sua ajuda e compreensão seria impossível conciliar os meus papéis sociais, familiares e pessoais.
Sinto-me feliz por ter regressado à Escola. Penso que tive muita sorte por ter sabido aproveitar esta oportunidade. Considero os meus professores excelentes, os meus colegas espectaculares e gosto imenso do Curso que frequento – Curso Tecnológico de Acção Social.
Quando concluir o 12º Ano (que será no próximo ano, se Deus quiser), talvez possa melhorar a minha carreira profissional. Mas, se não conseguir, não dou o tempo como perdido, pois foi muito importante e muito enriquecedor a nível pessoal.
A minha avozinha já dizia noutros tempos que «o saber não ocupa lugar, minha menina.»
Foi pena eu não ter acordado há mais tempo!
Ah! Se tivesse acordado há mais tempo não teria convivido com estas pessoas e teria sido de outra maneira…E… do que eu gostei, foi deste momento da minha vida sem qualquer alteração.
Lilagante
15 de Maio de 2007
Em primeiro lugar, o facto de todas as minhas companheiras de vida académica terem ficado pelo caminho e, do grupo, quase ninguém ter completado o 9º Ano provocou em mim uma grande desmotivação. Em segundo lugar, as condições de vida familiar não eram as melhores para, naquele tempo, poder estudar. O meu pai era funcionário (revisor) da CP e não vinha a casa com regularidade. A minha mãe explorava um estabelecimento comercial (café e mercearia de aldeia) onde ocupava quase todo o seu tempo, pois todos sabemos que este tipo de actividade, numa aldeia, não tem horário de abertura, de encerramento e nem de almoço.
Quando regressava da escola, ajudava a minha mãe nas tarefas domésticas, pois, naquela altura, ainda não havia as «Marias» que, felizmente, vieram poupar muito esforço e tempo às mulheres – máquinas de lavar roupa e louça. Embora a minha mãe não me obrigasse a cumprir estas tarefas e até me aconselhasse a dedicar-me mais aos meus estudos, eu não deixava de a ajudar pois a sobrecarga do seu trabalho não me deixava concentrar devidamente nas minhas obrigações escolares. Como agravante a minha casa era por cima do café, onde havia constantemente barulho e até altas horas da noite.
Passaram-se quase 25 anos e, durante esse tempo, sinceramente, nunca pus a hipótese de regressar à Escola. Isso era uma questão que nunca existia ou se, por um momento, existia, eu punha de lado não deixando que criasse raízes.
Os anos foram passando e pouco a pouco a minha capacidade de discernimento foi crescendo.
Num dado momento da minha vida, daqueles momentos de reflexão que, por muito que não queiramos, todos fazemos, dei conta que cometi alguns erros e que ainda era tempo de corrigir alguns deles. Procurei algumas pessoas mais ou menos da minha idade que frequentavam o Ensino Nocturno e troquei com elas algumas ideias. Foi esta atitude que fez renascer em mim a vontade de aprender e valorizar-me. Tinha de tomar a decisão…foi difícil… «conciliar o papel de mulher, dona de casa, mãe e trabalhadora…e ainda …estudar à noite! Que tarefa árdua! Serei capaz?»
Não fiquei parada. Decidi então voltar à Escola. Fui pedir informações à Escola Secundária Martinho Árias onde me esclareceram que para fazer o 10º, 11º e 12º anos tinha duas opções: uma seria participando em aulas, outra seria em regime não presencial. Após o esclarecimento de algumas dúvidas fiz a minha matrícula, optando pelo regime não presencial. A outra opção era muito exigente para uma aluna com tantas obrigações fora da Escola pois o horário escolar era das 19H às 23H 50 m.
Quando iniciou o ano lectivo 2005/2006, eu fui ao primeiro dia (noite) de aulas. Achei tudo muito estranho e ao mesmo tempo tudo muito especial. Eu?!! Ali sentada?!! De novo… na cadeira da escola?!! Com o quadro, os professores, as colegas…Os meus olhos devem ter estado mais azuis do que o costume, com a adrenalina que me corria nas veias!
Os professores explicaram que o regime não presencial era mais difícil, pois iríamos ter exames no fim de cada módulo e sem assistir às aulas seria tarefa custosa.
Decidi então pelo regime presencial, uma vez que me sentia como uma criança, «com sangue na guelra». Aquele ambiente estava a rejuvenescer-me.
Como geralmente acontece em qualquer situação nova, tive algumas dificuldades de adaptação aos novos horários da minha vida, à coordenação de todas as minhas tarefas e ao espaço escolar que partilhava com colegas e professores. Durante as aulas sentia dificuldades na forma de me expressar oralmente e na escrita.
O tempo foi passando e eu passei a sentir-me muito mais à vontade.
Consegui fazer o 10º Ano com resultados excelentes.
Estou a fazer o 11º Ano e desejo voltar no próximo ano lectivo para atingir o meu objectivo – 12ºAno.
Tenho a certeza que vou conseguir, devido a dois factores essenciais: força de vontade interior e ajuda especial do cônjuge.
Sinto imensa força interior para levar a bom porto o que me propus fazer e como não costumo desistir! … A colaboração do cônjuge também é deveras importante, pois sem a sua ajuda e compreensão seria impossível conciliar os meus papéis sociais, familiares e pessoais.
Sinto-me feliz por ter regressado à Escola. Penso que tive muita sorte por ter sabido aproveitar esta oportunidade. Considero os meus professores excelentes, os meus colegas espectaculares e gosto imenso do Curso que frequento – Curso Tecnológico de Acção Social.
Quando concluir o 12º Ano (que será no próximo ano, se Deus quiser), talvez possa melhorar a minha carreira profissional. Mas, se não conseguir, não dou o tempo como perdido, pois foi muito importante e muito enriquecedor a nível pessoal.
A minha avozinha já dizia noutros tempos que «o saber não ocupa lugar, minha menina.»
Foi pena eu não ter acordado há mais tempo!
Ah! Se tivesse acordado há mais tempo não teria convivido com estas pessoas e teria sido de outra maneira…E… do que eu gostei, foi deste momento da minha vida sem qualquer alteração.
Lilagante
15 de Maio de 2007
1 comentário:
Poie eu cá partilho a opinião da sua avó e também acho que o saber não ocupa lugar. E também nunca é tarde para aprender também é uma grande verdade. Eu fico sempre muito contente quando vejo alguém como a Isilda arregaçar as mangas e lançar-se de cabeça numa tarefa destas. E emociono-me quando leio estes textos porque calculo como deve ser dificl conciliar tudinho... e também tem sorte com a família. O seu filho tem muito orgulho no facto de a mãe ser aluna na escola ... bem se vê quando ele cá vem. Beijinhos e boa sorte e boa continuação...
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